FILOSOFIA MODERNA PROF MAURO DE SOUZA
INTRODUÇÃO À FILOSOFIA MODERNA
1. Fatores revolucionários
A Idade Moderna
(que vai de meados do século XV ao século XVIII), traz em seu bojo alguns aspectos sociais, políticos,
econômicos e culturais que nos ajudam a compreender as mudanças na produção
filosófica dessa fase. A partir do
século XV, uma série de acontecimentos deflagrou diversos processos que levaram
a grandes transformações nas sociedades europeias. Entre eles, podemos
destacar:
- A passagem do feudalismo para o capitalismo – que se vinculou ao florescimento do comércio, ao estabelecimento das grandes rotas comerciais, ao predomínio do capital comercial e à emergência da burguesia.
- A formação dos Estados nacionais – que fez surgir novas concepções político-econômicas, como a discussão sobre as formas do poder político.
- O movimento da Reforma – que provocou a quebra da unidade religiosa europeia e rompeu com a concepção passiva de ser humano, entregue unicamente aos desígnios divinos, reconhecendo o trabalho humano como fonte da graça divina e origem legítima da riqueza e da felicidade.
- O desenvolvimento da ciência natural – que criou os métodos científicos de investigação, impulsionados pela confiança na razão humana e pelo questionamento de sua submissão aos dogmas do cristianismo. A igreja católica, por sua vez, perdia nesse momento parte de seu poder de influência sobre os Estados e de dominação sobre o pensamento.
- A invenção da imprensa – que possibilitou a impressão dos textos clássicos gregos e romanos, contribuindo para a formação do humanismo.
2. Renascimento
Segundo Cotrim;
Fernandes (2010, p.220), o movimento cultural que contribuiu par essas
transformações é conhecido como Renascimento (séculos XV-XVI). Tendo por berço
a península Itálica, criaria as bases conceituais e de valores que permitiriam
o impulso da razão e da ciência no século XVII.
A
razão, de acordo com o pensamento da renascença, era uma manifestação do
espírito humano que colocava o indivíduo mais próximo de Deus. Ao exercer sua
capacidade de questionar o mundo, o homem simplesmente dava vazão a um dom
concedido por Deus (neoplatonismo). Outro aspecto fundamental das obras
renascentistas era o privilégio dado às ações humanas, ou humanismo. Tal característica
representava-se na reprodução de situações do cotidiano e na rigorosa
reprodução dos traços e formas humanas (naturalismo). Esse aspecto humanista
inspirava-se em outro ponto-chave do Renascimento: o elogio às concepções
artísticas da Antiguidade Clássica ou Classicismo. Essa valorização das ações
humanas abriu um diálogo com a burguesia que floresceu desde a Baixa Idade
Média. Suas ações pelo mundo, a circulação por diferentes espaços e seu ímpeto
individualista ganharam atenção dos homens que viveram todo esse processo de
transformação privilegiado pelo Renascimento. Ainda é interessante ressaltar
que muitos burgueses, ao entusiasmarem-se com as temáticas do Renascimento,
financiavam muitos artistas e cientistas surgidos entre os séculos XIV e XVI.
Além disso, podemos ainda destacar a busca por prazeres (hedonismo) como outro
aspecto fundamental que colocava o individualismo da modernidade em voga.
A
aproximação do Renascimento com a burguesia foi claramente percebida no
interior das grandes cidades comerciais italianas do período. Gênova, Veneza,
Milão, Florença e Roma eram grandes centros de comércio onde a intensa
circulação de riquezas e ideias promoveram a ascensão de uma notória classe
artística italiana. Até mesmo algumas famílias comerciantes da época, como os
Médici e os Sforza, realizaram o mecenato, ou seja, o patrocínio às obras e
estudos renascentistas. A profissionalização desses renascentistas foi
responsável por um conjunto extenso de obras que acabou dividindo o movimento
em três períodos: o Trecento, o Quatrocento e Cinquecento. Cada período
abrangia respectivamente uma parte do período que vai do século XIV ao XVI.
Durante
o Trecento, podemos destacar o legado literário de Petrarca (“De África” e
“Odes a Laura”) e Dante Alighieri (“Divina Comédia”), bem como as pinturas de
Giotto di Bondoni (“O beijo de Judas”, “Juízo Final”, “A lamentação” e “Lamento
ante Cristo Morto”). Já no Quatrocento, com representantes dentro e fora da
Itália, o Renascimento contou com a obra artística do italiano Leonardo da
Vinci (Mona Lisa) e as críticas ácidas do escritor holandês Erasmo de Roterdã
(Elogio à Loucura).
Na
fase final do Renascimento, o Cinquecento, movimento ganhou grandes proporções
dominando várias regiões do continente europeu. Em Portugal podemos destacar a
literatura de Gil Vicente (Auto da Barca do Inferno) e Luís de Camões (Os
Lusíadas). Na Alemanha, os quadros de Albercht Dürer (“Adão e Eva” e
“Melancolia”) e Hans Holbein (“Cristo morto” e “A virgem do burgomestre
Meyer”). A literatura francesa teve como seu grande representante François
Rabelais (“Gargântua e Pantagruel”). No campo científico devemos destacar o
rebuliço da teoria heliocêntrica defendida pelos estudiosos Nicolau Copérnico,
Galileu Galilei e Giordano Bruno. Tal concepção abalou o monopólio dos saberes
desde então controlados pela Igreja.
3. René Descartes: o racionalismo
Para
Cotrim; Fernandes (2010, p.228) o racionalismo designa a doutrina que
privilegia a razão no processo de conhecer a verdade. René Descartes (1596-1650) nasceu em La Haye, França, em uma
família de prósperos burgueses. Decepcionado com a formação jesuíta (tomista-aristotélica) que
recebera, decidiu buscar a ciência por conta própria, esforçando-se por
decifrar o “grande livro do mundo”.
Método
cartesiano
Regra
da evidência
A primeira
consistia em nunca aceitar algo como
verdadeiro sem conhecê-lo evidentemente
como tal: isto é, evitar
cuidadosamente a precipitação e
a prevenção; não incluir nos meus juízos nada que não se apresentasse tão clara e
distintamente à minha inteligência
a ponto de excluir qualquer
possibilidade de dúvida.
Regra
da análise
A segunda era dividir o problema em tantas partes quantas fossem necessárias para melhor poder resolvê-lo.
A segunda era dividir o problema em tantas partes quantas fossem necessárias para melhor poder resolvê-lo.
Regra
da síntese
A terceira, conduzir por ordem os meus pensamentos, começando pelos objetos mais simples e mais fáceis de conhecer, para subir pouco a pouco, gradualmente, até o conhecimento dos mais compostos; e admitindo uma ordem mesmo entre aqueles
que não apresentam nenhuma ligação natural entre si.
A terceira, conduzir por ordem os meus pensamentos, começando pelos objetos mais simples e mais fáceis de conhecer, para subir pouco a pouco, gradualmente, até o conhecimento dos mais compostos; e admitindo uma ordem mesmo entre aqueles
que não apresentam nenhuma ligação natural entre si.
Regra
da enumeração
Por último, sempre fazer enumerações tão completas, e revisões tão gerais, que tivesse certeza de nada ter omitido.
Por último, sempre fazer enumerações tão completas, e revisões tão gerais, que tivesse certeza de nada ter omitido.
Também
consiste o método na realização de quatro tarefas básicas: verificar se
existem evidências reais e indubitáveis acerca do fenômeno ou coisa estudada; analisar,
ou seja, dividir ao máximo as coisas, em suas unidades de composição,
fundamentais, e estudar essas coisas mais simples que aparecem; sintetizar,
ou seja, agrupar novamente as unidades estudadas em um todo verdadeiro; e enumerar
todas as conclusões e princípios utilizados, a fim de manter a ordem do
pensamento.
4. Baruch Espinosa
Nasceu
na Holanda, em 24 de novembro de 1632, Amsterdã —
21
de fevereiro de 1677,
Haia foi um dos
grandes racionalistas
do século
XVII dentro da chamada Filosofia
Moderna, juntamente com René
Descartes e Gottfried Leibniz. Nasceu em Amsterdã, nos Países
Baixos, no seio de uma família judaica portuguesa e é considerado o fundador do
criticismo
bíblico moderno. Desenvolveu
um racionalismo radical, que se caracterizou pela crítica às superstições religiosa,
política e filosófica. De acordo com o filósofo, a fonte de toda superstição é
a imaginação. Incapaz de compreender a verdadeira ordem do universo, a
imaginação credita a realidade a um Deus transcendente e voluntarioso, nas mãos
de quem os seres humanos não passam de joguetes. A partir da superstição
religiosa, desenvolvem-se as superstições políticas e filosóficas.
Deus imanente - para combater
essas superstições em sua origem Espinosa escreveu a Ética, texto no qual busca provar, como em uma demonstração geométrica, a natureza racional de Deus, que se
manifesta em todas as coisas (Deus imanente). Desse modo, Deus não está fora
nem dentro do universo: ele é o próprio universo (COTRIM; FERNANDES, 2010,
p.230). Espinosa discordava da ideia de
um Deus transcendente, superior a tudo, fora e além do mundo, pois, para ele,
separar Deus do mundo é admitir duas substâncias, e isso já seria uma
incompatibilidade com a própria definição de substância. No seu entender
substancia “é o que existe em si e por si é concebido, isto é, aquilo cujo
contexto não carece do conceito de outra do qual deva ser formado”. Para ele,
só há uma substância, Deus, que “existe em si e por si é concebido”. Se assim
é, então a natureza não pode ser outra substância separada de Deus. Logo, para
o filósofo, Deus e a natureza são a mesma coisa. No entender de Espinosa a
natureza é a manifestação da única substância existente: Deus.
Por manter essa concepção, Espinosa é chamado de monista,
pois, segundo ele, a realidade é composta de uma substância única. Ele também é
considerado panteísta quando defende que “tudo é Deus”, “Deus é tudo”. O
panteísmo é uma corrente que identifica Deus em todas as coisas, defendendo que
“tudo é Deus”. (do grego pan = tudo; théos = Deus). Deus se
manifesta em tudo o que existe no mundo, em cada criatura em particular, em
cada fenômeno, tudo é a manifestação de Deus e de seus atributos. O Deus de
Espinosa é imanente, porém sua imanência não significa, segundo o filósofo, que
Deus interage com o mundo, para ele, Deus é o próprio mundo, Deus é a própria
natureza. Deus se manifesta através de leis naturais. Ele identifica Deus em
todas as coisas e confunde o Criador com a criação.
5. Blaise Pascal
Cotrim;
Fernandes (2010, p.231), foi um filósofo que viveu na época do grande
racionalismo, mas que foi um pensador
contra a corrente, isto é, um crítico de seus contemporâneos e da confiança
excessiva na razão. Apesar de ter sido um grande matemático e físico e de ter
inventado a primeira calculadora, não aceitava o reducionismo matemático nas
questões humanas. Exemplo disso é a sua
frase lapidar: “ O coração tem razões que
a razão desconhece” (Pascal, Pensamentos, p. 107). Pascal preferiu
refletir sobre a condição trágica do
ser humano, ao mesmo tempo magnífico e miserável, capaz de alcançar grandes
verdades e gerar grandes erros.
A razão não é suficiente a si mesma, ela tem
limites, e Pascal reconhece esses limites. Estabelece que a ética, a vida
social e a religião é que definem o mundo humano real e esse mundo real em
grande parte foge das possibilidades da razão. Mas mesmo no mundo natural a
razão é limitada, pois os segredos da natureza estão encobertos na experiência
que constantemente aumenta em quantidade, intensidade e valor. Uma hipótese que
busca explicar um acontecimento na natureza pode ser validada, negada ou
permanecer duvidosa, e a experiência permanecendo duvidosa demonstra claramente
que a razão tem seus limites. A razão também demonstra ser limitada quando
busca definir as noções fundamentais de uma área do conhecimento pois ela não
consegue definir os princípios últimos da própria razão.
Pascal demonstrou grande preocupação com as
questões teológicas de sua época, defendia que as ações humanas não são
suficientes para a salvação dos indivíduos, para que as pessoas se salvem é
necessária a interferência, o auxílio de Deus, a salvação dessa forma se torna
mais difícil e não é o resultado direto das ações humanas. São nas nossas ações
que vão aparecer o livre arbítrio e no livre arbítrio aparece a ação de Deus
pois foi ele que nos concedeu a liberdade de escolher nossos atos.
É também teológica a preocupação de Pascal quando
define que as verdades estabelecidas pelos filósofos e teólogos antigos deve
ter o mesmo valor das novas teorias, o que é necessário ser feito é a
diferenciação de que em determinadas áreas os pensamentos antigos tem
supremacia, mas em outras devemos levar em conta os argumentos contemporâneos.
Em teologia o peso dos escritos antigos é definitivo para se descobrir a
verdade, e a razão não tem muito a dizer sobre eles, ou seja, os fundamentos da
fé estão acima da natureza e da razão. Mas sobre a interpretação e a capacidade
de conhecimento das experiências naturais, é a razão que tem a supremacia. É
dessa forma que a inteligência e o conhecimento humano tem a capacidade de se
ampliar sem interrupções.
6.Empirismo
O
palco inicial do empirismo moderno foi a Inglaterra. Nesse país, grande parte
da burguesia, a partir do século XVII, conquistou não apenas poder econômico,
mas também poder político e ideológico, impondo o fim do absolutismo
monárquico, durante a Revolução Gloriosa
(COTRIM; FERNANDES, 2010, p.235-236).
Contrariamente aos defensores do inatismo (Platão e
Descartes), os defensores do empirismo afirmam que a razão, a verdade e as
ideias racionais são adquiridos por nós através da experiência. Antes da
experiência, dizem eles, nossa razão é como uma “folha em branco”, onde nada
foi escrito; uma “tábula rasa”, onde
nada foi gravado. Somos como uma cera sem forma e sem nada impresso nela, até
que a experiência venha escrever na folha, gravar na tábula, dar forma à cera. No
decorrer da história da Filosofia muitos filósofos defenderam a tese empirista,
mas os mais famosos e conhecidos são os filósofos ingleses dos séculos XVI ao XVIII,
chamados, por isso, de empiristas ingleses: Francis Bacon, John Locke, George
Berkeley e David Hume.
Na verdade, o empirismo é uma característica muito
marcante da filosofia inglesa. Na Idade Média, por exemplo, filósofos
importantes como Roger Bacon e Guilherme de Ockham eram empiristas; em nossos
dias, Bertrand Russell foi um empirista. Que dizem os empiristas? Nossos
conhecimentos começam com a experiência dos sentidos, isto é, com as sensações.
Os objetos exteriores excitam nossos órgãos dos sentidos e vemos cores,
sentimos sabores e odores, ouvimos sons, sentimos a diferença entre o áspero e
o liso, o quente e o frio, etc.
As sensações se reúnem e formam uma percepção; ou
seja, percebemos uma única coisa ou um único objeto que nos chegou por meio de
várias e diferentes sensações. Assim, vejo uma cor vermelha e uma forma
arredondada, aspiro um perfume adocicado, sinto a maciez e digo: “Percebo uma
rosa”. A “rosa” é o resultado da reunião de várias sensações diferentes num
único objeto de percepção. As percepções, por sua vez, se combinam ou se
associam. A associação pode dar-se por três motivos: por semelhança, por
proximidade ou contiguidade espacial e por sucessão temporal. A causa da
associação das percepções é a repetição. Ou seja, de tanto algumas sensações se
repetirem por semelhança, ou de tanto se repetirem no mesmo espaço ou próximas
umas das outras, ou, enfim, de tanto se repetirem sucessivamente no tempo,
criamos o hábito de associá-las. Essas associações são as ideias. As ideias,
trazidas pela experiência, isto é, pela sensação, pela percepção e pelo hábito,
são levadas à memória e, de lá, a razão as apanha para formar os pensamentos.
6.1. John Locke
Em
sua obra Ensaio acerca do entendimento
humano, Locke combateu durante a doutrina cartesiana segundo a qual o ser
humano possui ideias inatas. Ao
contrário de Descartes, defendeu que nossa mente, no instante do nascimento, é
como uma tábula rasa. O substantivo tábula significa “tábua” ou “placa de
madeira” ou outro material; o adjetivo rasa
que dizer “plana, lisa”. Assim, a expressão tábula rasa usada por Locke tem o
significado de “tábua lisa”, isto é, tábua na qual nada foi escrito nem
gravado. Ao nascer, nossa mente seria como um papel em branco, sem nenhuma
ideia previamente escrita.
Locke
retomava, assim, a tese empirista segundo a qual nada existe em nossa que não
tenha sua origem nos sentidos. O filósofo defendeu que as ideias que possuímos
são adquiridas ao longo da vida mediante a experiência sensível imediata e seu
processo interno. Desse modo, o conhecimento seria constituído basicamente por
dois tipos de ideais:
- Ideias da sensação – são nossas primeiras ideias, aquelas que chegam à mente através dos sentidos, isto é, quando temos uma experiência sensorial, constituindo as sensações. Essa ideias seriam moldadas pelas qualidades próprias dos objetos externos. Por sensação Locke entende, por exemplo as ideias de amarelo, branco, quente, frio, mole, duro, amargo, doce etc.
- Ideias da reflexão – são aquelas que resultam da combinação e associação das sensações por um processo de reflexão, de tal maneira que a mente vai desenvolvendo outra série de ideias que não poderiam ser obtidas das coisas externas. Seriam ideias como “a percepção, o pensamento, o duvidar, o crer, o raciocinar” (Locke, Ensaio acerca do entendimento humano, p.160).
O
filósofo admitia, no entanto, que nem todo conhecimento limita-se,
exclusivamente, à experiência sensível. Considerava, por exemplo, o
conhecimento matemático válido em termos lógicos, embora não tivesse como base
a experiência sensível. Nesse sentido, Locke não era um empirista radical
(COTRIM; FERNANDES, 2010, p.237).
7. Immanuel Kant
Para
Cotrim; Fernandes (2010, p.245), Kant é considerado o maior filósofo do
Iluminismo alemão. Para ele, a filosofia deveria responder a quatro questões
fundamentais: o que posso saber? Como devo agir? O que posso esperar? E, por
fim, o que é o ser humano? Esta última questão engloba as três anteriores.
Maioridade kantiana - em sua obra O
que é ilustração, Kant sintetiza seu otimismo iluminista em relação à
possibilidade de o ser humano guiar-se por sua própria razão, sem se deixar
enganar-se pelas crenças, tradições e opiniões alheias. Nela, descreve o
processo de ilustração como sendo a saída do ser humano de sua “menoridade”, ou
seja, um momento em que o individuo, como uma criança que cresce e amadurece,
torna-se consciente da força e independência (autonomia) de sua inteligência
para fundamentar sua própria maneira de agir, sem a doutrinação ou tutela de
outrem (COTRIM; FERNANDES, 2010, p.245).
Segundo
Kant, o esclarecimento é um processo de emancipação intelectual, de superação
da ignorância e da preguiça de pensar por conta própria. É a busca de
autonomia, de maioridade; é o esforço para sair da menoridade e para isso é
necessário ter a ousadia de fazer uso de seu próprio entendimento. Como ele
mesmo diz: "ousa, atreve-te, a saber". Para Kant é preciso descobrir
quais são os nossos limites e possibilidades em relação ao conhecimento.
Portanto, cabe a pergunta: o que podemos conhecer? Qual o limite de nosso
conhecimento?
Para
Kant, é preciso esforço para pensar por conta própria, ou seja, ser livre.
Pois, para o entendimento nada mais se exige senão liberdade. Por isso se o
homem não é livre, não pode ser autônomo e independente. Segundo Kant, o homem
é um ser moral, daí que deve ser responsável e, portanto, livre. Pois à medida
que ele assume seu compromisso e responsabilidade, é de fato livre. E,
portanto, moral. Desta forma, o que ele faz, já não é conforme o dever, pois se
assim fosse estaria sendo condicionado, dependente dos outros, mas o faz por
(puro) dever, por ser livre, independente, autônomo e incondicionado.
Ora,
somente através do esclarecimento, o homem pode tornar-se mais humano e,
portanto, emancipado, mais livre, uma vez que neste mundo tudo deve estar a
serviço do ser humano por isso, o ser humano nunca deve ser utilizado como um
meio, mas deve ser sempre o seu próprio fim. Através da razão o ser humano tem
a capacidade de pensar, a razão lhes dá unidade conceitual, permite pensar.
Kant
argumenta que o povo tem oportunidade de expandir a liberdade de espírito e,
pouco a pouco, se torna cada vez mais capaz de agir de acordo com a liberdade.
Deste modo, os homens devem ser vistos como pessoas, como sujeitos, e não como
coisas. O homem deve ser respeitado por sua dignidade, isto é, por sua própria
humanidade. Hoje mais do que nunca é necessário reintroduzir o esclarecimento
em nossa sociedade, em nosso cotidiano, pois vivemos numa época em que poucos
são livres, independentes e emancipados do monopólio do poder capitalista.
Para Kant é imprescindível a razão para
adquirir conhecimento. A filosofia é para ele, atividade crítica, exame,
questionamento da razão humana. Determinar os limites e as possibilidades do conhecimento
é a tarefa da filosofia crítica. Para Kant, o esclarecimento é o processo de
independência intelectual, é a ousadia de romper as barreiras da ignorância e
pensar por si mesmo. Por conseguinte, o esclarecimento requer o rompimento da
tutela, a capacidade de fazer uso próprio da razão, isto é, sem ser direcionado
por outro. Por isso, Kant define o esclarecimento como a coragem de fazer uso
de seu próprio entendimento, a coragem de decidir, de servir-se de si próprio
sem a condução de tutores. Romper as barreiras da preguiça, da covardia e
chegar a fazer uso do teu próprio entendimento.
Esclarecimento implica em
emancipar-se, autodeterminação decidir e agir sem a direção de outrem. Ser
esclarecido é saber 'cair e levantar-se' sem se deixar intimidar, sem se deixar
atemorizar afim de outras tentativas. Esclarecimento é tentar conseguir pela
transformação do próprio espírito, ergue-se da dependência, da menoridade e
empreender então uma caminhada por si mesmo. Esclarecimento é produzir a
verdadeira reforma no modo de pensar; no entanto, esse esclarecimento exige
autonomia e liberdade para fazer o uso público de sua razão em todos os
assuntos.
Como
assinala Cotrim; Fernandes (2010, p.245), umas das questões mais importantes do
pensamento de Kant é o problema do
conhecimento, a questão do saber. Na Crítica
da razão pura, ele distingue duas formas básicas do ato de conhecer:
1)
Conhecimento
empírico
(a posteriori) – aquele que se refere
aos dados fornecidos pelos sentidos, isto é, que é posterior à experiência. Por
exemplo, para fazer afirmação “Este
livro tem a capa verde”, foi necessário ter primeiro a experiência de ver o
livro e assim conhecer a sua cor; portanto, trata-se de um conhecimento
posterior à experiência;
2)
Conhecimento
puro (a priori) – aquele que não depende de
quaisquer dados dos sentidos, ou seja, que é anterior à experiência, nascendo puramente de uma operação racional. Exemplo: a afirmação
(juízo) “Duas linhas paralelas
jamais se encontram no espaço” não se refere a esta ou àquela linha paralela,
mas a todas. Constitui, assim, um conhecimento universal. Além disso, é uma afirmação que, para ser válida, não
depende de nenhuma condição específica. Trata-se, portanto, de um conhecimento necessário.
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